sexta-feira, 14 de julho de 2017

São duas da manhã e o teto branco é mais interessante que as ruas apinhadas de gente no Cais do Sodré.
Penso, penso até me doerem as têmporas e o estômago.

Pernas, mexam-se.
Tenho de sair desta cama, soltar-me dos cadernos e abraçar corpos.

E tudo em que penso, é no dia da amanhã,
e no dia a seguir,
e no dia a seguir a esse,
até te imaginar velho, rodeado de netos, sem te lembrares do meu nome.

Os beijos nos bancos de trás do carro.
As corridas na areia, de noite,
a dança no meio do mato.
Que todas estas coisas apenas existam no meu cérebro.

As pessoas voam dentro de nós, mudam os órgãos de sítio, põem a cabeça no lugar do coração e o coração na mão esquerda. E desaparecem. Como se fosse fácil viver com um coração na mão esquerda.

A paranóia do esquecimento.

O esquecimento. Essa palavra que tanto me atormenta. Que me dói pronunciar.
A minha mente sempre me atormentou.
Faz questão de me lembrar das datas, da comida, das cores dos olhos, da gestualidade das mãos. Tudo é fácil de recordar.
É tão fácil de doer.


(é impressão minha ou este texto ficou tão estranho mas com algum potencial? Hum...)



quinta-feira, 13 de julho de 2017

Olho para os teus olhos da mesma maneira que olho para o mar. Tão estranho encontrar o mar nos olhos de alguém.
O mar sempre foi a minha maior admiração. Tão profundo, tão belo, tão denso. Impenetrável, para sempre um mistério.
Mas encontrei-te, penetrei-te, nadei dentro de ti como nado no mar.
Mas encontrei a tua essência, de onde vem essa tua beleza.
Mergulho em ti.
Mato a minha sede nas tuas lágrimas.
Na tua densidade.
És o mar com que sempre desejei fundir-me.

domingo, 9 de julho de 2017

.

Estranho como os lugares se tornam pessoas. Pessoas adoradas que caminham por cima de nós, sem o sabermos. Pisam-nos, vivendo em silêncio. Que triste a vida se torna quando as pessoas desaparecem, assim, por entre os dedos. E ainda nos dizem que é natural. A vida continua. Continua, pois, o sol não vai parar com a minha tristeza. Mas tudo existe ainda, no meu peito,  na minha cabeça e sobretudo, nos sítios. Naquele sítio, à beira do rio, que se tornou ainda mais belo por ser nosso. Lembro-me dos cabelos a esvoaçar, o teu abraço quente, a proteger-me da brisa. Passaram-se assim horas, entre silêncios, beijos e palavras de amor. E um belo pôr-do-sol, em pleno Dezembro, o mais bonito, porque estava contigo. Mas não me dói mais. A dor acaba por desaparecer. É bom, passar pelos sítios e sorrir, porque as lágrimas já o tempo as levou, e tu também. Guarda as minhas lágrimas, e lembra-te que o amor também é tristeza. As promessas foram com o vento. Os abraços ficam nos nossos peitos. E o meu ser, a minha existência, há muito que a levaste. Agora, sou outra. O amor leva-nos.

sexta-feira, 7 de julho de 2017

final de tarde. é verão, o sol ainda está alto. deitada, no chão, de olhos semicerrados, apaixono-me pela luz que se invade entre as minhas pestanas. de frente ao sol, a olhá-lo, vejo as cores, as formas inexpressáveis que este cria nos espaços entre as minhas pestanas. é quase como estar de baixo de água. nunca vi estas formas, esta vida, esta beleza, num filme, nem escritas num livro. como é bom estar sóbria! azul, celeste, verde, até vermelho, sobrevoam-me a íris. natural, simples, magnífico. é tão fácil encontrar a beleza. não consigo expressar a bela imagem que é o sol entre as pestanas. mas rapidamente, me canso. tenho sede de mais sensações, mais belezas, quero me arranquem o coração do peito e me puxem para fora de água. fecho os olhos, e navego pela minha imaginação, até o cérebro se desligar e entrego-me à calma do final de tarde, ao pousar do sol, embalando-me num sono, ao som das gaivotas.

terça-feira, 4 de julho de 2017

Acalmante

Esqueço-me sempre que o comboio para o Rossio vem às e 26 e não às e 22 como o que vai para Entrecampos. Espero, assim, 10 minutos. A estação tem três pessoas. Podera, é meio-dia, as pessoas trabalham a esta hora. E depois há uma percentagem que anda perdida de comboio em comboio, encantando-se com a paisagem fugaz oferecida pelas janelas, mas chega para matar o vazio no peito, por uns segundos. Leio o livro que comprei há duas semanas, um do Al Berto, que me enche a alma de lágrimas e vontade de viver. Vivo assim, a vida dos outros. Sinto sensações de personagens que não me são reais. Não lhes posso tocar, mas habito por baixo das suas peles. O comboio aproxima-se e custa-me desviar os olhos das belas palavras. Não costumo sentar-me nos transportes, tenho pernas jovens que aguentam o peso da minha cabeça. Mas hoje não aguentam o peso do meu coração, e lá me apoderei de um lugar, à janela, claro. Bastei-me da minha leitura. Estranho, nem observei as pessoas a meu redor, pois alimento-me das minhas observações. Vejo rostos, mãos, olhos, gestos, abraços, flores, cores e fecho os olhos e crio a minha história na minha cabeça. Afinal de tudo, a imaginação é a minha melhor forma de viver.