domingo, 30 de abril de 2017

Às vezes, só me apetece tirar as roupas do meu corpo, entrar nos meus lençóis, colocar-me em posição fetal e adormecer.
Parece que mais nada existe sem ser a escuridão e a minha existência.
Depois acordo, e há luz, tanto luz, tanta vida.
E fico cansada. Aliás, exausta.
Hoje só quero ficar aqui. Eu e o nada.
Absolutamente nada.
A minha cabeça está às voltas, o meu coração aperta-se, a solidão está a bater à porta.
Porém, serena eu estou.
E olho para a desarrumação do meu quarto, para o meu caos de estar.
Que interessa.
Nada interessa.
Tudo é tão insignificante.
Eu poderia desaparecer eternamente nesta escuridão.
Que diferença faria.
Eu só quero dançar entre as árvores e apaixonar-me loucamente por um sorriso.
Mas os lençóis aconchegam-me e puxam-me. Agarram-me, impedem-me. Sussurram que estou bem, que aqui estou bem. Não há turbulência.
Lá fora há tanta turbulência. Tanta dor. Tanta sensação.
Fica aqui.
Adormece, e vive nos teus sonhos.
Estás linda.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Danny Boy,
I love you so.
Agarra-me a saia
e faz ecoar os nossos sorrisos
pelas ruas desertas do Porto.

Oh Danny boy, Oh
Danny boy.
Agarra-me pela cintura,
e dancemos as valsas
pela noite dentro
no meio da estrada.
Só tu e eu, e o som das nossas vozes.

I love you so.
Eu corro atrás de ti
até me doer os pés e o peito explodir,
não sei se de cansaço,
se de paixão.

domingo, 23 de abril de 2017

Por entre as conversas fúteis e por esta confusão de palavras e sons à minha volta, encontro-me a mergulhar numa água cristalina. Só vejo tons de azul e verdes, variados. Aqueles que vemos quando mergulhamos com óculos de piscina no mar. Mas num mar limpo, limpíssimo. Vejo as bolhas do meu ar, a luz do sol a tentar perfurar o oceano. Quão belo e misterioso isto é. O sol a tentar entrar no mar, mas apenas ficar à tona, pois tudo é escuro, breu. Que mundo será este sobre os meus pés. Um mundo do qual tenho um medo tremendo. Um medo que me faz doer o peito só de imaginar na sua dimensão. Como de quando penso no que vai para além do céu. Como tudo me inalcançável e me escapa por entre os dedos. Volto-me para cima, para a luz, para o confortável. Vejo o céu. Tenho de fechar os olhos devido ao sol. Desliga-se-me a visão. Oiço as ondas, oiço a água nos meus ouvidos. Oiço a água a empurrar as rochas na costa e o vento no meu rosto. Som bem mais belo que aquele que oiço do eco das conchas. Tristemente, volto à realidade. Olho os rostos, que continuam dispersos nas suas conversas que me são indiferentes. Olho em redor. Procuro poesia pelo cenário. Foco-me numa cadeira que estava ligeiramente mais para trás que as outras, numa mesa. E imagino-te lá sentado, com o teu livro do Helberto Helder e a tua cabeça tão perto das páginas, que as palavras se dissipam pelos teus olhos, para cheirar, retirar o odor de toda a poesia. E imagino as tuas mãos a manusear o livro como se de um instrumento se tratasse. E eu, no chão, deitada, a fitar-te, a decorar cada gesto teu, para depois te desenhar pelos meus cadernos.
Mas para isto, tenho de ser realista e parar de imaginar coisas.
Raios.

domingo, 16 de abril de 2017

Sentar-me sobre a colina e observar a barragem e as ilhas sobre ela. Pouca intervenção humana observo nesta paisagem. O sol lá ao fundo, a esconder-se nas nuvens e, em breve, nas montanhas e nas águas. As nuvens não vão permitir ao céu assumir os tons alaranjados e rosas que tanto me enchem o peito e me esvaziam os pulmões. No entanto, as nuvens deixam-me ver o círculo perfeito do sol. Que mais preciso? Em nada penso. Minto. Penso nas palavras que podem incorporar a esta visão, este sentimento. Eu transbordo por todo o lado. Mas transbordo o quê? Nada. para que preciso de transbordar algo? Tão simples, tão belo, tão fácil. E passo as mãos pelas flores que estão à minha volta. Olhos os rostos que estão à minha volta, com a mesma expressão que eu. Excepto um. O de uma criança. Ele corre, ele suja-se na terra, ele aborrece-se com o sol. Recordo-me bem que parar era uma seca. Observava os meus pais, os meus tios, os meus avós, sentados à mesa horas infinitas, a conversar ou parados a olhar para o horizonte de uma paisagem e eu, criança, a querer correr e cair pelas ervas. Queria abraçar árvores, queria apanhar borboletas e deitar-me na relva e rebolar-me nela. E agora estava eu, parada, a olhar o sol, as águas, as cores do céu, feliz, a ver-me também refletida no olhar daquela criança que queria correr pelos prados e abraçar ovelhas, mas, sem essa vontade. Apenas com um sorriso nostálgico, com lágrimas dentro de mim, imaginando-me, criança, a correr entre as árvores com os meus primos, de mãos dadas, com risos ecoados pelas ruínas do castelo mouro da vila, escondendo-nos dos adultos.
Agora estou eu adulta. A criança que fui morreu num cérebro ocupado, sem tempo de dançar no meio da rua.
À beira da barragem, com os pés sobre misturas de areia, terra e flores e a mãozinha dela agarrada à minha, enquanto observávamos o belo Alqueva e as ilhotas que este tem dentro de si e o castelo lá ao fundo do tamanho da palma da mão dela.

   Teresinha, este momento nunca se vai repetir. Nunca mais, minha querida.

 Mas Inês, para o ano estamos cá outra vez. E tiramos uma foto também.


    A foto não tem cheiro, não tem tacto. Cheiras as águas? Sentes a areia sobre os teus pés? A fotografia capta só uma imagem. Confia sempre é nos teus olhos. Sê sempre criança, Teresinha, não penses nas fotografias. Vive este momento. Agarra bem a minha mão, olha bem para a paisagem. Amanhã pode estar tudo diferente.


Pois é.


   Oh Teresinha. Tomara eu ter 8 anos, ver tudo tão belo como tu vês.

Para o ano estamos cá outra vez.

   Pois estamos. Estaremos sempre aqui, na nossa cabeça estamos sempre aqui, sobre este belo quadro. E 20 anos vão passar, e a tua mãozinha vai ser do tamanho da minha, mas podemos sempre voltar aqui.


domingo, 9 de abril de 2017

Hoje, observei o rosto da minha mãe, poro a poro. Mergulhei nas suas rugas escassas, na profundeza do olhar, do carinho cravado no seu rosto enquanto me observava também. Imaginei-a, com 15 anos, a correr pelos campos lá em Trás-dos-Montes, com os seus amigos. Livre de rugas e de dores nas costas, que ela tanto se queixa depois de estender a roupa três vezes e de fazer o almoço. Imagino o seu riso a ecoar, abanando os ramos das árvores. Imagino-a a cair e a mirar as flores que a envolvem, com o cabelo comprido na cara. Imagino o sentimento que a transborda do coração, o sentimento de ser imortal, eterna, sempre jovem. Olha para o céu, com os olhos semicerrados devido ao sol, até os fechar e viajar pelos pensamentos sobre o filho do padeiro, ou sobre o que vai ser o jantar preparado pela tia. Sobre os pés descalços, umas margaridas.

E agora, tantos anos passados, observo o seu rosto de mulher feita, que tanto viveu e sofreu, que perdeu a mocidade. Sou eu que carrego aquele sentimento, aquela esperança e imortalidade.
E assim, continuarei a passar, de geração em geração, os sorrisos entres as flores e os abraços aos amantes que desapareceram no tempo, com o vento da juventude.

sexta-feira, 7 de abril de 2017

Hábitos estranhos, mas poéticos, talvez

- no caminho para casa, há uma grade colada à calçada que me acompanha na caminhada. Por vezes, gosto de dedilhar os dedos na grade enquanto ando aqueles metros intermináveis, e sentir a dormência nas mãos, até não suportar.

-quando vou para o metro, ou para o comboio ou quando me distraio das palavras de um professor e olho para a janela, gosto de olhar intensamente para o céu, na esperança de encontrar uma irregularidade no azul.

-por vezes, tiro os olhos do meu livro para observar, mais uma vez, os prédios, os rostos, as árvores para lá da janela à procura de novidade.

-às vezes, sentada no comboio, imagino-me a pôr uma pequena navalha nas bochechas a pensar num sentimento novo, rodeada de aristocratas russos.

domingo, 2 de abril de 2017

História sem Início e sem Fim

A minha mãe diz que vou encontrar o amor dentro de uma livraria, feiras de livros ou num museu. Dei-lhe razão.
Porém, sozinha me encontro.

Enquanto passeava pelos corredores, com as paredes cheias de quadros, enquanto saltava a vista de quadro em quadro, deparei-me com os teus olhos, de um azul misterioso. Fujo e refugio-me nos quadros.

Agora só vejo os teus olhos nos rostos desenhados.

E procuro o teu reflexo nas jarras de prata.

E vejo-te pelos corredores, procuro-te pelos interstícios das colunas e das esculturas.

E, lentamente, vou esquecendo a cor exata do teu azul, a expressão serena do teu rosto, a curva do teu sorriso, o som da tua voz.

Eternamente um estranho, porém, um sentimento quente no coração por um breve segundo. Uma história que nunca começará. E alegra-me.