domingo, 27 de março de 2016

Outro

O que eu dava para ser outro. Ter outra alma, outra personalidade. Não ser o que sou, ter defeitos mais vulgares, em vez de ser este ser que me repugna sempre que acordo. Como gostava de me livrar desta alminha e deste corpo, destas mãos que não fazem o que eu lhes peço, destes olhos que nada vêm. E ser outro, um ser humano talentoso, útil, inteligente. Mas não. Nasci num rio negro, com mãos de manteiga, olhos preguiçosos, cabeça vazia. E enquanto escrevo isto, este sentimento de querer ser outro, cresce cada vez mais, e lágrimas correm na minha face e o que faço? Eu tento ser outro. Tento ser diferente, tento aperfeiçoar as minhas qualidades e minimizar os meus defeitos, mas continuo a acordar e a ser isto, uma rapariga torta. Tudo em que toco, parte-se ou perde-se. Tudo o que faço, não me chega. E nada muda, nada se altera, continuo a acordar na mesma cama, na mesma, alma, no mesmo corpo, com este sentimento preto, de sonhar ser outro, porque sonhar em mim é inútil.

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