sábado, 27 de maio de 2017

atiro pedras com os meus atos.
Perdoa-me. por favor, Perdoa-me.
a minha cabeça não pára, o meu coração apenas serve para me circular o sangue. Desculpa, eu nunca quis magoar o teu.
eu não sei.
não sei nada sobre a vida, sobre as pessoas.
e o meu silêncio,
transforma-se em pedras, em rochas, em paredes.
Perdoa-me.
tenho tantos rascunhos. riscos e mais riscos. palavras imperceptíveis que me vieram à cabeça, e logo esta se arrepende. a tinta ainda está a secar. e o papel já está no lixo.
que faço da minha vida?
quem sou eu?
de volta a estas quatro paredes, de coração morto.
estou à espera que alguém me salve, porquê?
porque é que preciso tanto que alguém me leia a alma, através da dor do brilho dos meus olhos?

já não chorava há algum tempo, digo.
tanta gente.
música demasiado alta nos meus ouvidos.
pessoas a tocarem-me, a dirigirem palavras a mim.
o que digo, o que faço?
danço?
o meu corpo não se mexe. os meus pés estão colados ao chão.
Salva-me.
Tira-me daqui.
uma dor no peito sufoca-me. não consigo, porque me fazes isto? eu não consigo.
odeio.
odeio.
isto.
isto sou eu.

os lençóis estão tão limpos e lisos.
parece que nunca dormi ali.
de resto, o caos. livros ali, acolá,
textos que eu nem sei quem os escreveu. eu, claro.
fui mesmo eu?
ou um reflexo do que julgo ser eu?
nem sei o que estou para aqui a dizer.
só sei que me quero deitar no tapete,
e dormir.
com um livro no peito.

quarta-feira, 24 de maio de 2017

o caderno que comprei há um mês continua com as páginas vazias.
não sei o que se passa comigo.
quando me encontro sozinha,
procuro-me preencher-me de companhia, fugindo da minha.
um jazz de fundo,
abraços ao meu gato,
vou para a biblioteca passar a mão pelos livros,
ou ir para a rua e andar de olhos fechados.
a caneta tem durado bastante, e os dedos não se cansam.
o piano está a apanhar pó.
as minhas pernas não se cansam.
para onde vai a minha juventude?
calço os sapatos,
em busca de a salvar.
um vestido curto,
batom vivo nos lábios,
um livro na mão e dinheiro para a sangria.
deito-me sobre a relva e observo o sol por entre os ramos das árvores.
oiço as vozes,
as conversas supérfluas.
futebol,
política,
a saída à noite da semana passada,
estava tão bêbado.
finjo que oiço, que me interesso, tento agradar.
não quero saber.
eu só quero observar o céu e chorar a olhar o mar.
mergulhar naquele cais alentejano e nadar pelas águas sujas,
deitar-me entre as flores,
e emocionar-me até me doer a alma.
a minha juventude não é como a vossa.

quinta-feira, 18 de maio de 2017

São vinte e trinta e seis, ainda consigo apanhar o comboio das e quarenta e sete. Está tudo bem.
Chego à estação. A dor de estômago vazio não me vai permitir concentrar nos livros que tenho na mala. Logo agora que requisitei uns poemas do Al Berto, e apetecia-me tanto sentir qualquer coisa no peito.
O comboio chega e oiço o senhor a dizer para ter cuidado com o espaço entre o cais e o comboio. Observo o tal espaço. É enorme. Eu poderia dar uns pequenos passos em frente e todo o meu corpo cairia por ali a abaixo. Lembrei-me logo do meu querido romance do Tolstoi. E, fiquei triste. Um sentimento nostálgico misturado com tristeza. Uma longa história para colocar nesta.

Tão pouca gente!

Não gosto de me sentar.
Encosto-me ao vidro.
Respondo rapidamente a umas mensagens no telemóvel, e os meus olhos desviam-se para o céu. Que cores! Ignoro logo o que tenho nas mãos e olho, olho com paixão o que se encontra lá fora. A paisagem que vejo todos os dias, repetidamente. Mas nunca me canso. Então com o céu a mudar de cores.
E como mudava!
Primeiro vi lilás. Muito clarinho, e os prédios brancos pintados também dessa cor. O poder do céu!
Depois, transformações de amarelo e azul, enquanto passava um avião que não conseguia rasgar as duas cores. E as nuvens de azul.
A chegar ao meu destino, era uma mistura de tudo.

Depois de um dia cansativo, nada melhor que um abraço deste céu por uns breves minutos e apaixonar-me por estas coisas tão simples.

E frio, tanto frio.

O vento a tapar-me os olhos.

Um gato de olhos verdes a observar-me.

Um casal que me sorri.

Uma música jazz nos ouvidos.

Um passo de dança pelo caminho.

E o dia acaba quando coloco as chaves na porta.
Porque em casa, nada acontece.

A vida está lá fora.
É lá fora que os pássaros cantam e as flores nascem.

sexta-feira, 12 de maio de 2017

Atravesso a rua. A mesma de todos os dias. Já conheço as flores de cor. As flores que tentam escapar por entre as pedras da calçada. Gosto de olhar para cada uma entre as minhas pressas para apanhar o comboio. São milésimos de segundo de distracção no stress do meu quotidiano.
E lá vou eu, a apanhar o comboio das nove e trinta e dois.
Vou lendo as páginas do meu livro ao longo dos dez minutos de viagem. Sabe-me sempre a pouco. Por vezes penso que regressar ao meu velho hábito de percorrer a linha de metro inteira não seja má ideia, só para ter mais tempo de viagem pelos meus livros.
A professora vai falando. Tento perceber mas as distrações são tantas. A música que ouvi à pouco através dos fones, ainda está a ecoar na minha cabeça. Estão sempre pessoas a passar do outro lado da janela, e o meu pescoço tem sempre a tendência de conduzir a minha cabeça para a esquerda e observar cada rosto que passa. Penso em ti, às vezes. Tento não o fazer, que me dá sempre um dor leve no coração. Mais palavras e reacções à minha volta, a quais a minha mente tenta fugir.
Almoço.
Biblioteca. Que bem o meu coração está agora. Sentar-me entre a literatura irlandesa e americana, e estudar rapidamente e depois descer para a literatura portuguesa. Gosto muito dos poemas da Sofia. E do Al Berto. De vez em quando, aproveito intervalos de minutinhos para vir ler um verso. Uma sobremesa para a minha cabeça.
Já passa da hora da aula. Honestamente, faço de propósito. Quero que sintas a minha falta durante um pouco. Eu sei que não sentes, mas o meu coração acha que sim. Tem pena dele, não aprende. Olá, como estás, perguntas-me com um brilho no olhar. Estou bem, e tu. Estou bem, estou bem. E começas a falar e só olho para as tuas mãos, para os teus olhos, para os teus lábios. Estás triste? Não perguntes essas coisas. Não, estou bem. Não parece. Claro que estou triste, só te quero fazer cafunés e dar-te a mão no São Jorge, e dançar Blues pelas ruas de Lisboa. E oiço-te, oiço com atenção, pelo menos tento. Mais pessoas aparecem e fico na sombra, na tua sombra ou na sombra dos outros e desapareço. Sinto-me a desaparecer. Nem olhas para trás. Eu só queria que olhasses para trás e sorrisses. Só queria que dissesses adeus.
E assim, desapareceste.
Voltei para o comboio.
Voltei para a rua.
Desta vez, não olhei para as flores. Olhava para as nuvens e desejava que chovesse. Eu só queria que chovesse.
Chego a casa.
Abraço o meu gato. E, levemente, choro no seu pelo.
E amanhã tudo se repete.
Mas amanhã vou olhar para as flores. Vou sorrir-te. E não vou olhar para os teus lábios.

quinta-feira, 4 de maio de 2017

Não consigo lidar com o fogo no meu peito.
E pára de me olhar assim. Não finjas.
Eu se pudesse,
fazia ecoar o teu nome,
pelas ruas de Lisboa.
Se o meu corpo me permitisse,
eu agarraria a tua mão e beijar-te-ia o rosto,
com toda a leveza do meu ser.
Aconchegar-me-ia nos teus braços,
como se num sonho estivesse.

E acordo, e tens os olhos sobre mim.
E sobre o teu livro.
E sobre as pessoas à nossa volta.
E toda a minha insignificância me domina,
e só desejo derreter, ficar água e desaparecer entre as pedras da calçada.